Décathlon planeja produzir mais no Brasil
Não são 100 metros rasos, mas sim uma corrida de fundo. É dessa forma que a francesa Décathlon - uma das maiores varejistas de artigos esportivos do mundo - define sua estratégia em relação ao Brasil, onde a empresa vem progressivamente ampliando suas atividades. Nos últimos doze meses, quatro lojas foram abertas: Rio, Curitiba, São José (SC) e Florianópolis. A expansão inclui ainda uma unidade em Goiânia a ser inaugurada em dezembro e representará a 16ª loja no Brasil. A implantação em cidades como Belo Horizonte,
Brasília, Vitória, Porto Alegre ou ainda Caxias do Sul estão em estudo.
A Décathlon, presente em 20 países com 672 lojas (cerca de 50 inauguradas neste ano), não é apenas um revendedor de grifes como Nike ou Adidas. A empresa reúne 21 marcas próprias, uma para cada atividade esportiva, que representam, em termos mundiais, 65% do faturamento de € 6,3 bilhões. No Brasil, onde instalou-se em 2001, com uma primeira loja em Campinas (SP), as marcas próprias - como Domyos, de roupas e equipamentos de ginástica, musculação e esportes de combate - representam mais da metade das vendas, segundo Dominique Thomas, presidente da Décathlon no Brasil.
Há quase um ano e meio, Thomas, até então CEO mundial da Décathlon, passou a comandar a filial brasileira. A meta desse corredor de maratona de 51 anos, apaixonado por futebol, ski e alpinismo, é aplicar no Brasil o conceito que representa o DNA da Décathlon e a tornou célebre na Europa: produtos com inovações tecnológicas - como uma barraca de camping que se arma em dois segundos, tão facilmente como um guarda-chuva automático - a preços bem acessíveis.
Para isso, o reforço da produção local das marcas próprias se tornou um pilar da estratégia em relação ao Brasil, único país no continente americano onde a Décathlon está presente. Atualmente, 20% dos volumes vendidos já são fabricados no Brasil por terceirizados (80% do total são artigos têxteis). A empresa iniciou também a produção nacional de bicicletas de sua marca B'Twin e vai fabricar em breve cardiofrequencímetros da marca Geonaute, que, segundo Thomas, serão vendidos por quase a metade do preço atual no mercado brasileiro.
"Os artigos esportivos no Brasil são um dos mais caros do mundo. As grandes marcas internacionais custam o dobro ou até o triplo em relação à Europa. Quanto mais o mercado for ampliado, os preços serão mais baixos", disse Thomas ao Valor. O objetivo, diz ele, é que a produção da Décathlon no Brasil represente entre 50% e 60% do volume das vendas nos próximos três a seis anos.
"Isso vai depender do número de novas lojas, que permitirá ter um volume de vendas suficiente e, com isso, maior capacidade de produção para interessar mais parceiros fabricantes", afirma. Na prática, com mais lojas e maior volume de produção local, a Décathlon espera oferecer preços mais baixos do que os das indústrias brasileiras do setor. Em 2014, duas ou três novas lojas deverão ser abertas no Brasil, nas regiões Sul e Centro, diz Thomas, sem revelar os nomes das cidades.
Mas a Décathlon não visa abrir unidades no Brasil a um ritmo desenfreado. "É uma maratona, não uma corrida rápida. Queremos ter mais lojas a cada ano, mas é preciso manter um nível de crescimento do faturamento segundo o conceito do mesmo número de lojas do período", afirma o executivo. Nos últimos três anos, as vendas no Brasil, considerando-se o mesmo número de lojas, cresceram de 7% a 8%, diz Thomas.
A longo prazo, a meta é criar no Brasil uma rede de cerca de 60 ou 70 lojas, diz o presidente, o que dependerá da evolução das vendas no país nos próximos anos.
A Décathlon foi criada em 1976 par Michel Leclercq, primo do fundador do grupo de supermercados Auchan. A primeira unidade, aberta em Anglos, nos arredores de Lille, no norte França, havia criado um conceito inédito na Europa: uma loja que reunia no mesmo local produtos para diferentes atividades esportivas - na época eram 10 esportes, daí o nome Décathlon, hoje são várias dezenas. O foco, desde o início, foi o de uma clientela ampla, com produtos para toda a família, e não algo reservado à elite ou aos atletas, com um modelo de varejo semelhante ao dos supermercados.
A expansão dos negócios deu-se a partir de 1997, quando a empresa lançou suas primeiras marcas próprias, a Quechua, para esportes de montanha, e a Tribord, para os aquáticos. E começou a investir na tecnologia e inovação de seus produtos. "Deixamos de ser apenas vendedores de artigos esportivos. Controlar todo o processo de fabricação, desde a criação do produto até a venda, permite reduzir custos e garantir preços acessíveis", disse ao Valor Philippe Dourcy, diretor de comunicação do grupo Oxylane, dono da companhia desde 2008.
O Oxylane tem 21 marcas próprias esportivas e 12 marcas de componentes para equipamentos, além de outras redes de lojas de menor porte na França, que vendem artigos para apenas um ou dois esportes e consideradas "testes de varejo".
Com 55 mil funcionários e faturamento de € 7 bilhões no ano passado (a Décathlon representa 90% desse total), o grupo Oxylane também possui 4 fábricas próprias - China, Marrocos (têxteis), Lille, na França (bicicletas) e Romênia. Seu centro de pesquisas tem 530 engenheiros e 130 designers.
Anualmente, a Décathlon lança, em média, quase 3 mil produtos. A empresa também tem parcerias com 60 laboratórios e universidades internacionais. "A prática do esporte evolui. Os artigos esportivos terão cada vez mais tecnologia. Ela deve ser de fácil uso e barata", afirma Dourcy.
Entre os próximos lançamentos da Décathlon estará um smartphone para passeios na natureza (à prova de água, lama ou choques), que permite medir o pulso e a velocidade de caminhada, e também um bracelete que se conecta a um fone de ouvido e permite nadar ouvindo música e contar, ao mesmo tempo, o total de braçadas e a distância percorrida.
A inovação pode ser um trunfo contra a crise. Em 2012, as vendas na França (43% da receita global do grupo) cresceram 5%. Dourcy diz que a Décathlon tem sentido o impacto da conjuntura atual, principalmente em países como Espanha (100 lojas), Itália (mais de 80 unidades) e Portugal, o que vem levando a uma redução nos preços.
A Décathlon já está presente em boa parte da Europa: neste ano, foi a vez da Bulgária ganhar sua primeira loja. A estratégia é "concentrar os esforços" no Brasil, Rússia, China e Índia. "Os países dos Brics são uma prioridade na estratégia do grupo", afirma Dourcy. No Brasil, o plano de expansão ainda deverá passar por várias partes do país, com novas lojas.
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