Custo de morar no DF
Funcionalismo, habitação e transportes encarecem custo do brasiliense. Segundo economistas, além da inflação, hábitos e disposição de consumo da população deixa a cidade mais cara
Foto: Toninho Tavares
Alto custo: as pessoas vão ao supermercado e o arroz subiu 20%, enquanto anunciam uma inflação de 6%
A predominância do funcionalismo público na população, o monopólio das terras pelo poder público e o elevado custo do transporte são alguns dos fatores determinantes para o alto custo de vida na capital federal. Aliados aos itens que mais inflacionam, como alimentação e bebidas, e à alta carga tributária que incide sobre bens e serviços no país como um todo, os fatores encarecem a vida em Brasília e também influenciam a atração de investimentos para a capital.
O economista da Companhia de Planejamento do DF (Codeplan), Newton Marques, lembra que Brasília tem as especificidades que a diferencia das demais localidades brasileiras. Tudo remonta ainda a como foi fundada a capital. “Você imagina aqui é capital do país. As terras desde o início foram desapropriadas pelo governo, quase todas estavam nas mãos da Terracap, que faz as licitações. É claro que quando vem um monte de gente para cá a oferta é inferior à demanda e aí vem uma questão econômica com a oferta menor”, aponta o estudioso.
Ele destaca que a situação hoje já é diferente do passado porque se tem mais opções, mas no início Brasília era só o Plano Piloto. “Tinham os acampamentos, as dificuldades e começou-se a atrair outras pessoas. Os políticos tornaram Brasília uma atração prometendo lotes”, comenta.
O Plano Piloto, região central que abrange as asas Sul e Norte, Lago Sul, Lago Norte e Sudoeste, não refletem a situação de Brasília como um todo.
Com o desenvolvimento na saúde e educação, cada vez mais gente era atraída para a capital. “Aqui em Brasília quem quer ver a miséria tem que sair nos arredores, nós não temos favelas, nós tiramos tudo e botamos debaixo do tapete e jogamos lá pra longe".
Segundo Newton, o Plano Piloto se apresentava como um eldorado (cidade lendária feita em ouro e com tesouros), onde não tinha nenhum tipo de problema. “Você chega aqui e vê uma cidade moderna, onde se pode morar num apartamento com área de lazer e área verde. Isso atraiu construtoras para cá”, observa.
Outro fator de encarecimento do custo de vida em Brasília, segundo o pesquisador é a incapacidade da produção agrícola do DF abastecer a população local. “Vem quase tudo de fora. A nossa área rural é desenvolvida, mas não para abastecer a população daqui. Produz muita soja que é para exportação. Então tem alguns produtos, mas é insuficiente para abastecer o DF", analisa.
Entre as observações do pesquisador, está a influência do alto salário oferecidos pelo setor público, do qual grande parte da população faz parte.
Marques avalia, no entanto, que está mudando o perfil do servidor público que antes vinha muito de fora. “Quem está passando em concurso público, em geral, é filho de servidor público, porque servidor tem condições de pagar um cursinho preparatório e aí fica um ciclo vicioso. Daqui a pouco nós teremos uma casta que se reproduz dos filhos dos servidores públicos”, analisa.
Por conta dos salários elevados que grande parte do funcionalismo percebe, sem contar com o poder de aquisição de crédito devido à estabilidade dos cargos públicos, muitos dos serviços e bens no mercado de Brasília têm como público-alvo consumidor especialmente os servidores públicos. Daí o consumo em restaurantes do Plano Piloto ser relativamente “caro” e a oferta de produtos nos shoppings serem baseadas no padrão de vida dessa classe consumidora.
Percepção
Os índices de inflação não captam a realidade do custo de vida das populações. Por isso, é comum ouvir comentários de que o índice divulgado não é “real” visto que a sensação do consumidor é de que os produtos subiram de preço bem mais do que as informações oficiais. Segundo o economista Newton Marques, coordenador do Núcleo de Preços da Companhia de Planejamento do DF (Codeplan), um exemplo dessa situação é a diferença observada no período da implantação da moeda real até os dias de hoje. “É possível observar nesse período que o crescimento do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do DF é menor que do Brasil. Mas isso não é contraditório? Como é que todo mundo reclama do custo de vida de Brasília e nesses índices não estão sendo detectado?”, indaga.
Ele explica que ao IPCA se dá pela combinação de índices e são 9 grupos cujos índices são contabilizados. São eles: alimentação e bebidas; habitação, artigos de residência; vestuário; transportes; saúde e cuidados pessoais; despesas pessoais; educação; e comunicação. Cada item desses possui subgrupos e outros itens detalhados sendo cada um com impacto diferente na contribuição para o índice final.
“Se for pegar o dado celular por pessoa, o índice é alto, deve ter dois ou três por pessoa em Brasília. Carro também tem índice alto, dois carros por pessoa aproximadamente. Então qualquer índice que se pegar é elevado. As pessoas vão ao supermercado e o arroz subiu 20% enquanto anunciam uma inflação de 6%", explica.
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o IPCA do mês de julho em Brasília apontou que a variação de 2,17% no grupo alimentação e bebidas, enquanto transportes variou 20,01% e habitação variou 14,84%. Juntos, os três itens representaram cerca de 60% do índice total.
Universidade estuda índices locais
A Universidade Católica de Brasília (UCB) divulga, periodicamente, o Índice de Custo de Vida do DF (ICV-DF) que tem como finalidade medir a evolução do custo de vida em cinco regiões do DF: Asa Sul, Asa Norte, Ceilândia, Taguatinga e Guará. O levantamento é feito a partir do acompanhamento do custo de vida dessas localidades.
O indicador é apurado pelos alunos e professores do curso de economia da UCB, sendo calculado a partir de uma cesta constituída por 27 produtos, cujos preços são coletados durante a primeira quinzena de cada mês de referência e processados na segunda quinzena.
O economista César Vila Nova, professor de ciências econômicas da UCB e um dos responsáveis pelo levantamento do Índice de Custo de Vida do DF destaca que esse trabalho é feito para se ter uma ideia mais aproximada da realidade econômica das cidades pesquisadas visto que a inflação destaca nas pesquisas convencionais reflete a inflação total do DF. “No nosso índice não é a inflação total, mas sim a que o morador de Ceilândia e do Guará, por exemplos, enfrenta no dia a dia. Esse é o nosso custo de vida”, aponta.
Assim como outros pesquisadores têm apontado, Vila Nova destaca que Brasília é diferente do restante do país porque se trata de uma cidade administrativa. “Como você tem aqui a base do poder público cujo salário é muito grande e se sabe que o salário do servidor público é, em média, maior que do setor privado, então as pessoas têm um poder aquisitivo em média maior do que o restante do país, e isso causa essa discriminação de preço”, reflete.
O economista acrescenta que o custo de vida também está relacionado à disposição de pagar das pessoas. “Como o salário é maior, as pessoas em média estão dispostas a pagar mais, tem uma disposição maior para pagar por determinados produtos”.
O ICV-DF divulgado pela UCB revela o custo de vida nas diferentes cidades satélites a partir de uma descrição detalhada dos itens que sofreram maior e menor variação de preços. A partir do conhecimento apurado é possível apontar planos para a melhoria da qualidade de vida do local O Índice do Custo de Vida (ICV-DF) da UCB apontou que no mês de março houve uma alta de 3,11%. O custo médio da cesta no Distrito Federal, que em fevereiro era de R$ 281,43 teve o seu valor acrescido em R$ 8,76 e atingiu o valor de R$ 290,18 no mês de referência.
Segundo o levantamento, a cesta básica mais cara foi verificada no Guará (R$ 317,28), seguido do Plano Piloto (R$ 297,85), Ceilândia (R$ 292,08) e Taguatinga (R$ 253,52).
Ao analisar a diferença de preço entre o Plano Piloto e as demais regiões, destacou-se que em Taguatinga, cuja cesta básica é (14,88%) mais barata, paga-se R$ 44,33 a menos para consumir a mesma cesta de bens.
http://comunidade.maiscomunidade.com...R-NO-DF.pnhtml