Uma boa explicação sobre a Bolha imobiliária.
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O que ocorre quando uma Bolha Imobiliária desinfla?
Há algum tempo esse espaço é utilizado para falar sobre a questão imobiliária e a subida artificial de preços que ocorre no Brasil desde 2008, pelo menos
Parece claro que o assunto se popularizou e que muitos analistas com credibilidade, como o professor Samy Dana, mostram que a queda no preço dos imóveis é certa nos próximos anos.
De fato, algumas projeções indicam que o preço dos imóveis já está caindo em algumas regiões. Enquanto alguns recebem essa notícia com entusiasmo, outros ficam temerosos. Existem diversos medos coletivos associados à queda de preços nos imóveis, sobre os quais dissertaremos a seguir.
O cenário normal em relação ao ajuste de preços, em qualquer mercado, indica que os preços devem subir de acordo com a inflação. No entanto, quando se forma uma bolha especulativa (entenda o processo na segunda parte deste texto), os preços começam a subir em patamares muito acima da inflação, tornando-se insustentáveis a longo prazo. O tamanho da queda posterior depende basicamente do volume especulado (que podemos definir como o preço praticado – o preço “justo”, multiplicado pelo volume de vendas no período).
O cenário especulativo, por sua própria insustentabilidade, é dotado de uma noção de urgência muito forte. Em um determinado nível, o descolamento entre os preços praticados e os preços “justos” (que podem ser medidos como o preço na origem do movimento especulativo + a inflação do período) é tão grande que paralisa o mercado. Ninguém mais tem dinheiro para comprar. Depois de algum tempo de paralisação, os preços finalmente começam a cair. E é esse movimento que será o objeto de análise.
A queda de preços
É importante concentrar a análise do momento de queda de preços em dois campos específicos: o dos consumidores e o do ramo econômico. Os efeitos são diferentes, embora ambos mensuráveis. A intenção aqui não é chutar números ou fazer previsões e, sim, explicar o processo.
1) Os Consumidores
Imóveis contam com uma estrutura própria de financiamento, como todo ativo de alto valor agregado. Essa estrutura possibilita, em um cenário de normalidade, a compra dos imóveis pela maior parcela da população. Os largos prazos de financiamento fazem as prestações imobiliárias “caberem” dentro do limite de 30% de comprometimento da renda imposto pelo Banco Central.
No cenário anormal proporcionado pela especulação, os preços sobem acima da capacidade de endividamento do cidadão. Isso faz com que governos, bancos e empresas do ramo busquem formas de fazer o financiamento se adequar à renda do cidadão – seja reduzindo os juros, seja oferecendo subsídios, seja aumentando o prazo de financiamento
Geralmente, o “estouro da bolha” ocorre quando esses mecanismos de adequação de financiamento à renda do cidadão não conseguem mais alimentar o mercado. A situação está tão descolada da realidade que nenhum mecanismo é capaz de aquecer o mercado: pelo contrário, eles só alimentam a especulação.
Esses mecanismos também trazem efeitos colaterais gravíssimos. O alongamento do prazo de financiamento, por exemplo, faz com que a amortização da dívida nos primeiros anos seja risível. Em um cenário de queda de preços, o que acontece é o seguinte:
a) João financia 90% do valor de sua casa, comprada por R$ 250 mil reais. Paga R$ 25 mil à vista. Tem 225 mil reais de dívida. Financia sua dívida em 35 anos, a uma prestação inicial de R$ 2.115,00 ao mês (ela vai caindo muito gradativamente)
b) Com esse valor e esse prazo de financiamento, a amortização mensal sobre a dívida é de R$ 535,71. Em três anos, a amortização terá sido de R$ 19.285,56. A dívida será de R$ 205.714,44.
c) No entanto, nesses três anos o imóvel sofreu uma humilde queda de 20%, passando a custar R$ 200.000,00 (acredite, vai cair mais do que isso). José quer comprar a casa de João, mas não paga mais do que R$ 200.000,00 por ela. João, resignado, vende por esse preço. Mas ainda não consegue cobrir toda a sua dívida com o banco.
d) Resumo: João pagou, nesses três anos, R$ 25.000,00 de entrada, mais aproximadamente R$ 75.000,00 em prestações (foram R$ 2.115,00, de início, com ligeira queda no valor da parcela). E ainda tem uma dívida de R$ 5.714,44. Isso quer dizer que, por conta de uma queda de 20% no valor dos imóveis, que é uma previsão modesta, João desperdiçou R$ 105.714,00 em três anos, sem contar impostos e taxas de documentação e vistoria. Se tivesse pagado R$ 1.000,00 por mês de aluguel por uma casa, durante esses três anos, teria economizado R$ 69.714,00 no período.
Esse caso é ilustrativo de como as quedas de preço são prejudiciais para o consumidor que faz seu financiamento quando o imóvel está em um preço especulativo. No caso explicado, João continuou pagando suas parcelas em dia, mas, em boa parte dos casos isso não ocorre.
Recentemente, vimos isso ocorrer com o mercado automobilístico, que está repleto de pessoas com “bombas” na mão: carros com alto valor de parcela, financiados sem entrada em 84 ou 96 vezes, que hoje valem menos do que o valor de suas dívidas. No caso dos carros, o aumento da inadimplência e o aumento dos estoques nos pátios forçaram o governo a lançar um pacote de incentivos ao setor, para evitar demissões.
“Evitar demissões” é o principal objetivo do governo, atualmente. Isso porque a situação econômica consegue se sustentar, ainda que com incongruências, enquanto o nível de emprego está alto. Quando as vendas começam a arrefecer, a atividade econômica diminui e as empresas começam a demitir; aí explodem as grandes crises. Porque as pessoas desempregadas, além de não consumirem, em boa parte das vezes tornam-se inadimplentes. A inadimplência contamina o mercado e provoca prejuízos em diversos setores da economia, provocando mais demissões. Empresas começam a quebrar. E o círculo vicioso da recessão econômica está formado.
No entanto, a queda dos preços não indica apenas o fim de um ciclo de especulação que prejudica quem consome: indica também o esgotamento da atividade econômica. E é essa a segunda análise.
2) A atividade econômica no ramo de construção civil
Além de trazer grande impacto aos consumidores, a queda de preços também causa forte impacto na construção civil.
No setor, a queda de preços é mais consequência do que causa de algo.. Ocorre, especificamente, após um momento de forte expansão da atividade econômica, alimentada pela especulação. A relação entre oferta e demanda, que costuma estabelecer os preços no mercado, é rompida pela injeção de capital especulativo. O objetivo passa a ser, ao invés do consumo, o ganho fácil com a revenda do imóvel após algum tempo. No Brasil, algumas facilidades contribuem para aumentar a especulação, como a possibilidade de comprar imóveis “na planta”, sem nenhum contrato de financiamento assinado antes da entrega das chaves, em dois ou três anos.
A questão é que esse momento de especulação proporcionou o aumento da atividade econômica até o limite imposto pela capacidade de endividamento das pessoas. E isso deságua em dois movimentos: o do arrefecimento no ritmo de novos lançamentos imobiliários e o dos especuladores, que agora querem capitalizar em cima dos imóveis comprados há dois ou três anos.
Para o ramo econômico, é péssimo. A diminuição no ritmo de construções proporciona a desaceleração de diversos setores da economia e ajuda a explicar o crescimento pífio do PIB brasileiro em 2011 e 2012. Todo o ramo industrial de materiais para construção depende do ramo da construção civil. Fios, cabos elétricos, decoração, porcelanas, móveis planejados, tintas, cimento, serralheria, marcenaria e mais alguns ramos da atividade econômica dependem muito da construção civil para obter lucros. Em um cenário de desaceleração na construção civil, logo esses setores vão se ver forçados a demitir empregados, contribuindo para alimentar o círculo vicioso da recessão explicado anteriormente.
E agora?
A queda dos preços tem três momentos específicos: o primeiro, em que os preços começam a cair e a atividade econômica cai vertiginosamente. O segundo, em que os preços voltam a ganhar fôlego, ainda que momentâneo, por conta do público que poupou dinheiro e não queria comprar no ápice dos preços. E um terceiro, em que os preços caem até um patamar mínimo, em que os especuladores se desesperam e se desfazem de seus investimentos por “qualquer coisa”.
Como já explicado, esse movimento pode levar o país a um processo recessivo. Ou, pelo menos, desacelerar abruptamente o crescimento econômico, que já não anda muito bem. A opção do governo em fomentar o crescimento pelo consumo, praticada com vigor nos últimos cinco anos, está esgotada. O próprio governo já percebeu isso e lançou um pacote expressivo de investimentos em infraestrutura, para aumentar a taxa de investimento governamental sobre o PIB e a competitividade da nossa economia. No entanto, além de insuficiente, ele parece ser um pouco tardio para evitar os problemas econômicos iminentes.
No entanto, uma coisa é certa: é infinitamente melhor viver um período de aperto econômico do que continuar alimentando uma bolha especulativa como a dos imóveis no Brasil. Quanto mais se alimenta a especulação, maior será a quantidade de “ativos podres” depois e a necessidade de programas de recuperação. Esses possíveis programas, com o objetivo de salvar bancos e construtoras, só causarão a socialização dos prejuízos. Quanto menor for essa socialização, mais curta será a crise.
Então, agora é a pior hora possível para se comprar um imóvel. O mercado está saturado, as vendas estão em baixa e as poucas unidades vendidas estão indo para as mãos de especuladores interessados em lucros fáceis. Há um claro descompasso entre o aumento dos preços de imóveis e o aumento da renda do brasileiro. A hora é de poupar, de apertar os cintos e de evitar endividamentos desnecessários, para que o momento de queda no preço dos imóveis seja o menos traumático possível.
http://leorossatto.wordpress.com/201...aria-desinfla/